Foram vários os recados deixados sobre o rumo do País e os desafios que enfrenta no futuro. É preciso apostar no capital humano e, para isso, é necessária melhor educação, saúde e boa governação.
Angola precisa de mudar de rumo, investindo numa "mudança radical do sistema de educação e do modelo de ensino" e de apostar em políticas de saúde, que vão além dos medicamentos e da construção de hospitais, admitiu o ex-vice-presidente da República, Bornito de Sousa. Defende que escolas, estradas e energia devem ser a prioridade, a nível de infraestruturas.
Durante o discurso que efectuou no âmbito do Desconstruir do Expansão, no I Fórum de Energia e Ambiente (ver páginas 2 a 8), aludido ao tema "Angola num mundo sem petróleo", Bornito de Sousa deixou alguns recados sobre o que o País tem de fazer para inverter o quadro em que se encontra. "Temos de investir na juventude angolana, investir sobretudo na mudança radical do sistema de educação e do modelo de ensino, para que priorize as ciências e tecnologias com o modelo de ensino STEAM [acrónimo em inglês para as disciplinas Science, Technology, Engineering, Arts e Mathematics - Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática], vocacional e profissionalizante. No caso de Angola, estamos com 60% de ciências sociais e pouco menos do resto em engenharias. É preciso mudar rapidamente este padrão e olharmos para um ensino que tenha em vista os padrões do futuro", admite.
Numa altura em que o Executivo está a preparar a estratégia de longo prazo Angola 2050, o ex-vice-presidente não deixa de colocar o "dedo na ferida" sobre o ponto de partida em que o País se encontra. "O sistema de ensino hoje está a preparar os jovens para 2050? Os planos curriculares estão ajustados a 2050? Estamos a formar pessoas úteis para 2050? Os professores, com o maior respeito que tenho por todos eles, estão preparados para ensinar o meu netinho, que com um ano e oito meses já diz as letras do alfabeto em inglês de A a Z? Precisamos de mudar radicalmente e ter uma componente no ensino que é fundamental, que é a priorização da língua inglesa", sublinhou.
Além da educação, o número dois da primeira legislatura de João Lourenço enumerou outros desafios que o País enfrenta. "O combate à pobreza faz-se pela promoção do desenvolvimento local, pela capacitação dos jovens, das comunidades, capacitá-las a serem elas próprias a desenvolverem as coisas. Help people help themselves, não o contrário, o assistencialismo, que muitas vezes está subjacente aos nossos programas de protecção social".
A saúde é outra das áreas que, segundo Bornito de Sousa, necessita de outro olhar. "Saúde não é o hospital e medicamentos, isso é o fim da cadeia. É a governação local. Se os municípios tratarem da água potável, do saneamento básico, das condições de habitabilidade, da condição alimentar, da educação das pessoas, teoricamente os profissionais de saúde podem passar para o desemprego".
O ex-vice-presidente da República defendeu ainda a descentralização do poder como um mecanismo para desenvolver o País. "A participação dos cidadãos e das comunidades e o seu envolvimento na própria governação. E aqui, indirectamente, eu quero falar na importância das autarquias locais, que são uma emergência, uma prioridade".
Considera ainda que Angola precisa de criar condições para desenvolver um empresariado, uma rede de jovens empreendedores e uma classe média angolana. "Não podemos continuar, quase 50 anos depois da independência, em que para reparar um simples passeio, para fazer um lote de casas de dois ou três quartos, tem de vir uma empresa do continente A, B ou C. Temos que capacitar os angolanos para isso e comparticiparem nos rendimentos nacionais", sublinhou.
Outra questão que considera fundamental, não só para Angola mas para África, é "o investimento na paz, na estabilidade política e social e nas instituições democráticas e de segurança" nacional. "Felizmente, Angola já deu passos significativos nisso, mas devemos chegar a um ponto em que o desafio entre as pessoas, as comunidades e os países é quem consegue desenvolver melhor, criar melhores condições para a sua população e a sua juventude e não mais. A mim doí-me ver ainda hoje cenários em que o elemento preponderante de poder é o levantar uma arma. E, infelizmente, estamos a assistir a isso em África", rematou. Expansão